HOMENAGEM AO CENTENÁRIO DE HOMERO HOMEM, ESCRITOR CANGUARETAMENSE

Por Francisco Galvão
Membro do Instituto Histórico e Geográfico do RN e da Academia de Letras de Canguaretama


Fico imaginando se Homero Homem estivesse entre nós nesse momento especial da história. Que romance escreveria ao Brasil? Um escritor da sua grandeza nos presentearia com um texto insuperável. Teríamos, diante de sua inegável criatividade, um imenso prazer de ler. Nasceu em Canguaretama, em 5 de janeiro de 1921 e seu nome “Homero” fazia jus ao grego, pois sabia poemizar tão bem quanto seu homônimo. Seu pai, Joaquim Siqueira, um jurista pernambucano quem vinha da estirpe de Manuel de Mascarenhas Homem, foi um dos fundadores do América de Natal, o time vermelho, que já foi azul. 


Filosofar parece ser simples como o futebol, mas não é fácil. Só os bons escribas conseguem. Como dizia meu pai: “Onde estiver um Siqueira, haverá um homem inteligente!” O Rio Grande do Norte nos deu um desses, que foi Homero Homem de Siqueira Cavalcanti, e espero não custar muito a aparecer outro. Faria como os craques da bola, que chamam para si a responsabilidade e decidem a partida como se jogasse sozinho, como se bastasse ele para resolver o problema.


Homero Homem foi um esquecido na literatura dos potiguares. Escrevia sobre os dilemas, paradoxos e contradições humanas. Tais características são bem representadas em “Menino de Asas”, uma fantástica história do diferente, do excluído, tão atual em nosso tempo. O “Menino de Asas” era, sobretudo, o que acreditava num mundo melhor, por isso podia “voar” e ser diferente. Depois de tanto tempo ainda nos deparamos com pessoas que podam os nossos meninos que nascem com mais asas do que braços. O Menino de Asas, porém, não se deixou intimidar: fez de tudo para vencer a rejeição. Nessa luta, além do preconceito, ele pode descobrir também a amizade e o amor. 


Contradições humanas como essas estão presentes entre “Canguleiros e Xarias”, que apresenta a Natal provinciana que encanta tantos leitores, pois conta suas próprias histórias. Eram cenas simples, onde aconteciam batalhas instigadas na rixa de classes sociais e do bairrismo belicoso dos pobres Canguleiros moradores das Rocas e Ribeira contra os nobres Xarias que habitavam o bairro burguês da Cidade Alta. Já em “Cabra das Rocas” percebe-se mais uma vez o paradoxo, pois um garoto que morava no mangue, resolveu entrar na escola dos ricos e se tornar um “bacana”. Será que isso era atual nos nossos dias? Estamos vendo em HD a repetição daquele filme analógico? 


Aquela “Copa em Natal” deveria tê-lo ressuscitado, mas as coisas não funcionam assim; na cultura parece que vale a mesma lógica da caixinha de surpresa dos “Kinder Ovos” da vida. Sobre futebol escreveu coisas fantásticas e se tornou referência no assunto a nível nacional. Falava do esporte com a maestria dos grandes escritores, descrevendo jogadas e vivências cotidianas como um grande apaixonado, mostrando as emoções mais humanas dentro do campo. “O Goleador” e “O Moço da Camisa 10” foram duas obras primas do seu gosto incontestável pelo esporte.


Era, sobretudo, um nordestino aguerrido como as cactáceas, mas que, por dentro, era sensível como as flores dos tabuleiros litorâneos que conheceu em tenra idade. Só ele poderia expressar um “Luar Potiguar” e se tornou um “Agrimensor da Aurora”. Pelo número de edições dos seus livros constata-se que foi o mais lido de todos os ficcionistas norte-rio-grandenses. A Academia Brasileira de Letras não teve cadeiras suficientes para ele. O poeta Ledo Ivo, que tomou um desses assentos, teria sido seu único adversário intelectual. Divergiram e trocaram farpas, mas quando Homero faleceu, em 17 de julho de 1991, Ledo Ivo foi ao enterro e prestou homenagem ao desafeto de outrora.


Se estivesse vendo esses extremismos de hoje teria muito a falar, mostrando as contradições de quem renega a vacina e fura a fila para se vacinar primeiro; os que não querem mudanças e reclamam dizendo que não podemos continuar assim; os que criticam as administrações públicas e votam sempre nos mesmos candidatos. Homero mostrava, sem escrúpulos, as discrepâncias sociais sem ser muito percebido. Era aquele poeta potiguar distante, que morava no Rio de Janeiro e pouco se sabia sobre ele. Infelizmente, seus livros foram ficando escondidos nas prateleiras das bibliotecas. 

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