
O ministro da Justiça, Sergio Moro,
omitiu uma palestra remunerada que deu em setembro de 2016 ao
prestar contas de suas atividades quando era o juiz responsável pelas
ações da Operação Lava Jato em Curitiba.
O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, responsável pela revisão dos processos da primeira instância do Paraná, informou à Folha que
Moro declarou ter participado de 16 eventos externos em 2016, incluindo
9 palestras, 3 homenagens e 2 audiências no Congresso Nacional.
Mas a relação de eventos não inclui uma palestra mencionada numa mensagem que ele enviou ao procurador Deltan Dallagnol pelo aplicativo Telegram em 2017, que faz parte do pacote obtido pelo site The Intercept Brasil.
No dia 22 de de maio de 2017, Moro disse a Deltan que um executivo do
grupo de comunicação Sinos queria seu contato para fazer um convite.
“Ano passado dei uma palestra lá para eles, bem organizada e bem
paga”, escreveu o juiz. “Passa sim!”, respondeu Deltan, coordenador da
força-tarefa da Lava Jato em Curitiba.
Uma resolução aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça em junho de
2016 tornou obrigatório para juízes de todas as instâncias o registro de
informações sobre palestras e outros eventos que podem ser
classificados como “atividades docentes” pelas normas aplicadas à
magistratura.
De acordo com a resolução, os juízes têm 30 dias para informar sua
participação nos eventos e devem registrar data, assunto, local e
entidade responsável pela organização. As normas do CNJ não obrigam os
juízes a declarar se foram remunerados.
Em resposta a questionamentos da Folha, Moro afirmou
que a omissão da palestra em suas prestações de contas pode ter
ocorrido por “puro lapso” e disse que parte do cachê recebido foi
doada a uma entidade beneficente.
Dono de uma emissora de rádio e vários jornais na região do Vale do
Sinos, o grupo Sinos lotou um teatro de Novo Hamburgo (RS) para receber
Moro no dia 21 de setembro de 2016. Os 2.000 ingressos colocados à venda
se esgotaram em 48 horas.
O assunto da palestra era o combate à corrupção. Moro foi aplaudido
de pé ao entrar no palco e novamente no fim do evento, de acordo com
vídeos publicados nas redes sociais na época por pessoas que assistiram à
palestra.
Houve tempo para perguntas da plateia, e um dos espectadores quis
saber quando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) seria preso.
O público riu e bateu palmas. Depois que a plateia silenciou, Moro
disse, sorrindo: “Bem, para essa questão realmente não tenho nem como
começar a responder”.
Uma pessoa que participou da organização do evento afirmou à Folhaque
Moro ganhou pela palestra um cachê entre R$ 10 mil e R$ 15 mil. De
acordo com o TRF-4, Moro recebeu como juiz R$ 28,4 mil em setembro de
2016, já descontados os impostos.
Segundo a assessoria de imprensa do tribunal, Moro não declarou
nenhuma remuneração pelas palestras que informou ao TRF-4 em
2016. “Estão todas sem constar valor recebido, entendendo-se como
gratuitas”, disse a assessoria, em resposta à Folha.
Em 2017 e 2018, até abandonar a magistratura para ser ministro do governo Jair Bolsonaro (PSL),
Moro declarou participação em 25 eventos, conforme os registros
disponíveis no site do TRF-4. Em nenhum caso ele informou ter recebido
remuneração.
Um levantamento realizado pela Agência Pública em julho do ano
passado encontrou notícias sobre 12 cursos e palestras que Moro havia
dado sem informar ao tribunal. Ele registrou 5 desses eventos depois,
mas ignorou os outros 7.
Ao responder questionamentos do jornal Valor Econômico na época em
que o levantamento foi publicado, a assessoria de imprensa de Moro na
13ª Vara Federal de Curitiba afirmou que “as palestras ministradas pelo
juiz não são remuneradas”.
As mensagens obtidas pelo Intercept mostram
que Deltan indicou a Moro oportunidades para cursos e palestras
remunerados em duas ocasiões, em 2017. Nos dois casos o juiz disse que
não tinha espaço na sua agenda, mas acabou aceitando um dos convites.
Meses depois de receber a dica de Moro, Deltan fez uma palestra no
mesmo teatro que lotara para o juiz. O procurador esteve em Novo
Hamburgo no dia 15 de março de 2018. Cerca de 600 ingressos foram
vendidos desta vez.
Em mensagem à sua mulher nesse dia, Deltan disse ter cobrado R$ 10
mil pela palestra, reduzindo seu cachê a um terço do valor que chegou a
cobrar em outros eventos, de R$ 30 mil.
“Rádio ganha em imagem etc, preferi fazer essa concessão, até porque
nosso objetivo não é financeiro”, disse o procurador. Ele descreveu com
entusiasmo a reação do público à palestra: “Ficaram vidrados, aplaudiram
no meio e de pé ao fim. Engajados”.
Como a Folha e o Intercept revelaram em julho, Deltan chegou a cogitar a criação de uma empresa de palestras para lucrar com a fama alcançada na Lava Jato e faturou quase R$ 400 mil com eventos desse tipo no ano passado.
Ele recebeu R$ 426 mil como procurador em 2018, incluindo auxílio-moradia e outros penduricalhos, e descontados impostos.
O Conselho Nacional do Ministério Público permite
que procuradores façam palestras e sejam remunerados por isso. Como no
caso dos juízes, as normas tratam essas atividades como de natureza
docente. Não há, no entanto, nenhuma exigência para que os procuradores
informem sua participação nos eventos.
FOLHAPRESS
Sergio Moro Omitiu Palestra Remunerada em Prestação de Contas como Juiz Federal
Reviewed by Canguaretama De Fato
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